OS DIREITOS FUNDAMENTAIS E SUA HERMENÊUTICA

Abelardo Sampaio


Sumário: Introdução; 1. Os Direitos Fundamentais; 1.1 Delimitação Conceitual; 1.2 Desenvolvimento Histórico; 1.2.1 As Gerações de Direitos Fundamentais; 1.2.2 Evolução dos Direitos Fundamentais nas Constituições Brasileiras; 1.3 A Categoria Dogmática dos Direitos Fundamentais; 1.3.1 Normas de Direitos Fundamentais: Princípios ou Regras?; 1.3.1.1 Distinção entre Princípios e Regras; 1.3.1.2 As Normas de Direito Fundamental como Modelo Misto; 2. A Hermenêutica dos Direitos Fundamentais; 2.1 A Hermenêutica Constitucional; 2.1.1 Especificidades da Norma Constitucional; 2.1.2 Os Princípios da Interpretação Constitucional; 2.1.2.1 A Unidade da Constituição; 2.1.2.2 A Eficácia Integradora; 2.1.2.3 A Máxima Efetividade; 2.1.2.4 A Conformidade Funcional; 2.1.2.5 A Concordância Prática; 2.1.2.6 A Interpretação Conforme a Constituição; 2.1.3 A Interpretação Pluralista de Peter Häberle; 2.2 A Concretização como Método Hermenêutico das Normas de Direito Fundamental; Conclusão; Referências.

RESUMO
O presente artigo visa trazer um esboço acerca dos fundamentos teóricos da hermenêutica dirigida à interpretação dos direitos fundamentais, levando em conta a especificidade que estes direitos possuem e buscando apresentar um arcabouço teórico prático que permita ao intérprete-hermeneuta dar a estas normas o grau de alcance e efetividade que elas clamam pelo próprio papel que possuem no sistema moderno do Estado Democrático de Direito. Analisa-se a hermenêutica de forma geral, as especificidades das normas de direitos fundamentais e relacionando estes dois pontos chega-se à hermenêutica dos direitos fundamentais.

Palavras Chave: Hermenêutica; Direitos Fundamentais; Interpretação; Concretização

ABSTRACT

This article aims to bring a sketch about the theoretical foundations of hermeneutics addressed to the interpretation of fundamental rights, taking into account these rights specificities and trying to present a practical theoretical framework that allows the interpreter-hermeneuticians give to these standards the range and effectiveness that they cry out for its own role in the system of modern Democratic State Law. We analyze the hermeneutics in general, the specific standards of fundamental rights and linking these two points coming to the hermeneutics of fundamental rights.

Keywords: Hermeneutics; Fundamental Rights; Interpretation; Concretion
INTRODUÇÃO

O tema tratado no presente artigo é a hermenêutica dos direitos fundamentais no sistema jurídico brasileiro.

Inquestionável a relevância jurídica deste tema, dado o caráter fundamental, já explicito na denominação destes direitos e dos valores protegidos pelas normas que lhes consubstanciam no âmbito constitucional. Tratar então da interpretação destas normas traz consigo toda a relevância que possui a norma em si, uma vez que, é mediante, e somente com, a interpretação que tais normas ganham aplicação e efetividade.

A hermenêutica dos direitos fundamentais será tratada neste trabalho à luz da hermenêutica jurídica geral, passando para as especificidades das normas constitucionais e de direito fundamental expondo as razões porque estas merecem um método interpretativo específico e trazendo à baila qual seria este método.

A metodologia utilizada foi o desenvolvimento de pesquisa teórica baseada principalmente em livros, teses, dissertações, monografias e artigos, em meio físico e eletrônico, e também legislação e jurisprudência.

O primeiro ponto do trabalho foi reservado para a análise dos direitos fundamentais, trazendo a comento uma delimitação conceitual deveras necessária, o desenvolvimento histórico, suas gerações e a evolução desta espécie normativa junto às constituições pátrias. Em seguida abordou-se a questão da categoria dogmática a que pertencem as normas de direitos fundamentais, realizando uma distinção entre regras e princípios e a importância disto para o processo hermenêutico.

O segundo e último ponto deste trabalho, abordou diretamente a hermenêutica dos direitos fundamentais, dando ênfase primeiramente à hermenêutica constitucional, à necessidade de uma hermenêutica específica diante da especificidade destas normas. Traz também os princípios da interpretação constitucional e a teoria da sociedade aberta dos intérpretes constitucionais capitaneada por Peter Häberle. Em seguida defendeu-se a concretização como método hermenêutico adequado para a interpretação das normas de direito fundamental.

1. OS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Mister se faz uma digressão acerca da teoria geral dos direitos fundamentais, por óbvio de forma sucinta, nos limites necessários para a integração deste trabalho.

1.1. Delimitação Conceitual

José Afonso da Silva conceitua direitos fundamentais como sendo uma expressão mais adequada para designar as prerrogativas e instituições que, no âmbito do direito positivo, garantem uma convivência digna, livre e igual de todas as pessoas, constituindo caráter fundamental o fato de tratar-se de situações jurídicas sem as quais a pessoa humana não se realizaria, conviveriam ou mesmo sobreviveriam.

A definição apresentada, entretanto, assemelha-se muito com aquilo que se costuma conceituar como direitos da personalidade que, nos dizeres de Roxana Borges , são direitos que derivam da própria condição de ser humano, decorrentes da personalidade humana e que envolvem valores considerados como essenciais para a “vida humana”, entendida em consonância com a dignidade do indivíduo.

Porém os direitos fundamentais abrangem uma gama muito maior do que apenas os direitos da personalidade, por isto não tão esclarecedor apresenta-se o conceito trazido por José Afonso da Silva.

Marcus Vinícius Ribeiro chama atenção para o uso abrangente que se faz desta expressão abarcando diversas acepções como liberdades públicas, direitos humanos, direitos subjetivos públicos dentre outros, merecendo portanto uma delimitação conceitual, daquilo que neste trabalho será tratado como direitos fundamentais.

Antes de determinar qual o conceito de direito fundamental, importante trazer à baila algumas de suas características. Norberto Bobbio destaca com propriedade que a questão da “fundamentalidade” dos direitos tem sua raiz na historicidade, o que se considera como fundamental hoje não é aquilo que foi considerado como tal no início do século XX. Diz o autor:

Os direitos do homem constituem uma classe variável, como a história destes últimos séculos demonstra suficientemente. O elenco dos direitos do homem se modificou, e continua a se modificar, com a mudança das condições históricas, ou seja, dos carecimentos e dos interesses, das classes no poder, dos meios disponíveis para a realização dos mesmos, das transformações técnicas, etc. Direitos que foram declarados absolutos no final do século XVIII, como a propriedade sacre et inviolable, foram submetidos a radicais limitações nas declarações contemporâneas; direitos que as declarações do século XVIII nem sequer mencionavam, como os direitos sociais, são agora proclamados com grande ostentação nas recentes declarações. Não é difícil prever que, no futuro, poderão emergir novas pretensões que no momento nem sequer podemos imaginar, como o direito a não portar armas contra a própria vontade, ou o direito de respeitar a vida também dos animais e não só dos homens. O que prova que não existem direitos fundamentais por natureza. O que parece fundamental numa época histórica e numa determinada civilização não é fundamental em outras épocas e em outras culturas.

Alexandre de Moraes define os direitos fundamentais como um conjunto de direitos e garantias do ser humano, institucionalizados de forma a garantir o respeito à sua dignidade protegendo-o do arbítrio do poder estatal ao mesmo tempo em que estabelece condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana.

Além da historicidade demonstrada por Bobbio, o conceito apresentado por Alexandre de Moraes evidencia outra característica dos chamados direitos fundamentais: a institucionalização.

Esse caráter institucional dos direitos fundamentais é defendido ferrenhamente por alguns autores, dentre eles destacamos o posicionamento de Cruz Villalon , para quem:

onde não existir constituição não haverá direitos fundamentais. Existirão outras coisas, seguramente mais importantes, direitos humanos, dignidade da pessoa; existirão coisas parecidas, igualmente importantes, como as liberdades públicas francesas, os direitos subjectivos públicos dos alemães; haverá, enfim, coisas distintas como foros ou privilégios.

Defender uma afirmação neste sentido seria incorrer no risco de pregar um rol constitucional fechado de direitos fundamentais, com o que não se corrobora principalmente em razão da sua historicidade e variabilidade que não se compatibiliza com um enquadramento rígido e numerus clausus.

A Constituição Federal expressamente afirmou que aquele rol não se tratava de um quadro rígido, ao, no §2º reconhecer que existem direitos fundamentais decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, afastando, incontestavelmente, a idéia de taxatividade da enumeração constitucional.

Interessante se mostra o conceito de direitos fundamentais trazido por Pérez Luño que os define como um conjunto de faculdades e instituições que, em cada momento histórico, concretizam as exigências da dignidade, da liberdade e da igualdade humanas, devendo, estas, encontrarem-se positivadas pelos ordenamentos jurídicos.

Outro ponto que merece atenção trata-se da diferenciação entre os chamados direitos humanos e os direitos fundamentais, como sobredito, muitas vezes utilizados como sinônimos, porém que devem possuir significação diferentes.

Para diferenciá-los recorre-se à lição de Paulo Bezerra que, apoiado nas idéias de Perez Luño, traz direitos humanos como uma categoria de maior abrangência que serviria mesmo como base, substrato, para os direitos fundamentais, sendo estes últimos ”uma categoria descritiva dos direitos humanos, positivados no ordenamento jurídico” legitimados pelos primeiros.

Nesta definição o autor abarca todos os elementos demonstrados aqui, e traz também a idéia de positivação, mas não como um requisito de caracterização dos direitos fundamentais, e sim como uma conseqüência da sua própria existência, e não sua causa.

1.2. Desenvolvimento Histórico

Após definido o conceito de direitos fundamentais que será utilizado, papel importante exercerá o esclarecimento acerca do seu desenvolvimento histórico.

A origem dos direitos fundamentais aponta para o para o cristianismo, onde se afirma que estes foram pregados por Jesus aos seus fiéis . Porém, se entendidos tais direitos como forma de proteção do indivíduo em face da atuação arbitrária do Estado, podemos remontar esta origem ao antigo Egito e à Mesopotâmia, à época do terceiro milênio antes de Cristo. Neste diapasão, o Código de Hamurabi seria a primeira codificação a consagrar um rol de direitos humanos a todos os homens, dispondo ali sobre vida, propriedade, honra, dignidade e família.

Na Idade Média, mesmo se tratando de uma sociedade com estratificação extremamente rígida e uma cultura de devoção ao senhor feudal decorrente do expediente da vassalagem, era possível identificar documentos onde se previa a proteção aos direitos fundamentais, na maioria das vezes ligados ainda à limitação da atuação do poder estatal. Neste momento pode-se identificar a Magna Carta Inglesa de 1215 que reconhecia a liberdade de religião, o devido processo legal e a participação popular no julgamento dos crimes contra a vida .

Outro documento de extrema importância para a evolução dos direitos fundamentais foi o Petition of Rights de 1628, onde se buscava uma efetivação material, por parte do Rei, daqueles direitos instituídos pela Magna Carta.

Em seqüência identifica-se o Bill of Rigths de 1689, que representou uma enorme restrição ao poder estatal, prevendo dentre outras coisas, a liberdade de eleição dos membros do Parlamento; um reforço ao princípio da legalidade ao dispor que não poderia o Rei revogar uma lei ou suspender o seu cumprimento sem a aprovação do Parlamento; a criação do direito de petição e principalmente a vedação à aplicação de penas cruéis. Um passo atrás, porém, foi o não reconhecimento da liberdade religiosa, ao negar compatibilidade entre o Reino Protestante, e príncipes, reis e rainhas que participem ou comunguem da Sé e Igreja de Roma.

Um desenvolvimento considerável dos direitos fundamentais só veio ocorrer a partir da segunda metade do século XVIII, com o advento da Revolução Francesa de 1789, que trouxe para os direitos fundamentais o caráter da universalidade, calcada na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, que possuía um viés filosófico e teórico baseado nas teorias jusnaturalistas e no Contrato Social de Rousseau.

Esta declaração trazia em seu bojo disposições acerca do princípio da igualdade, liberdade, propriedade, princípio da legalidade, da reserva legal, anterioridade da lei penal, presunção de inocência, liberdade religiosa dentre outros, constituindo-se na efetiva consagração normativa dos direitos humanos fundamentais. Em seguida vieram as Constituições Francesas de 1971 e de 1973.

Merece transcrição o preâmbulo da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão :

O povo francês, convencido de que o esquecimento e o desprezo dos direitos naturais do homem são as causas das desgraças do mundo, resolveu expor, numa declaração solene, esses direitos sagrados e inalienáveis, a fim de que todos os cidadãos, podendo comparar sem cessar os atos do governo com a finalidade de toda a instituição social, nunca se deixem oprimir ou aviltar pela tirania; a fim de que o povo tenha sempre perante os olhos as bases da sua liberdade e da sua felicidade, o magistrado a regra dos seus deveres, o legislador o objeto da sua missão. Por conseqüência, proclama, na presença do Ser Supremo, a seguinte declaração dos direitos do homem e do cidadão.

Este preâmbulo traduz de maneira límpida o sentimento que envolveu a efetivação dos direitos humanos no decorrer da revolução burguesa, que buscava de todas as formas garantir, pelo menos formalmente, a dignidade, a liberdade, e a honra dos indivíduos que outrora eram quase que desconsiderados pelo regime absolutista.

A partir deste ponto, a doutrina costuma dividir a evolução dos direitos fundamentais em gerações, termo que vem sendo criticado por transmitir uma idéia de períodos estanques, incomunicáveis, pelo que se passou a utilizar a expressão dimensões dos direitos fundamentais, termo trazido por Paulo Bonavides, mas não se crê que esta modificação de nomenclatura traga grande diferença efetiva, motivo pelo qual se utilizará neste trabalho a divisão em gerações, já consagrada na doutrina.

1.2.1. AS GERAÇÕES DE DIREITOS FUNDAMENTAIS

Os direitos fundamentais erigidos após a Revolução Burguesa do final do século XVIII constituem aqueles a que se convencionou chamar de direitos humanos de primeira fase, são os direitos de liberdade correspondentes aos direitos civis e políticos.

Esta gama de direitos surge como resposta ao regime absolutista onde o Estado oprimia os indivíduos não respeitando nem ao menos a sua esfera individual. Os direitos oriundos dessa fase constituíam-se em direitos negativos, que visavam proteger o indivíduo da atuação do estado, que na época era visto como um inimigo do homem. Como exemplo destes direitos pode-se citar a liberdade de locomoção, de pensamento, de religião.

Como característica marcante deste período pode-se identificar a abstração em que eram concebidos os direitos fundamentais. A sua existência dava-se apenas no âmbito formal, não se encontrava instrumentos que garantissem a efetivação das disposições positivadas, relegando o aspecto material.

O fato catalisador da mudança de paradigma foi o advento da primeira grande guerra mundial e o surgimento do chamado Estado do Bem-Estar Social. A sociedade do pós-guerra exigia uma atuação ativa por parte do Estado, o que não se compatibilizava com a intervenção mínima pregada pelo liberalismo. Nesta fase é que surgem os chamados direitos sociais, e seu diploma marcante é a Constituição de Weimar.

Passa-se de um Estado apenas garantista para um Estado provedor, exige-se uma atuação prestacional voltada para a satisfação das carências coletivas, buscando realizar no plano concreto aqueles direito erigidos na primeira fase. Nesta geração podemos identificar o direito à saúde, ao trabalho, à educação etc.

A terceira geração dos direitos humanos fundamentais surge a partir de uma virada de foco acerca dos destinatários destes direitos. Antes centrados nos indivíduos enquanto pessoas livres (1ª fase), que deveriam possuir condições para viver (2ª fase), agora o vértice da aplicação passa a ser a comunidade como um todo. Corresponde ao surgimento dos direitos coletivos e difusos.

O direito à paz, ao meio-ambiente, à preservação do patrimônio cultural são exemplos de direitos de terceira geração. A grande questão acerca destes direitos era a definição de quem seriam seus credores e devedores , dificultando saber quem teria legitimação para pleitear a efetivação destes direitos e quem seria o pólo passivo desta relação, ou seja, de quem se poderia exigir essa prestação.

Ainda se fala em direitos fundamentais de quarta geração, capitaneados por Paulo Bonavides , que teriam origem na globalização e poderiam ser identificados como o direito à informação e o direito ao pluralismo. Essa geração demandaria um universalismo da sociedade e da democracia o que poderia resultar em uma supressão de culturas minoritárias e a submissão do resto do mundo à cultura jurídica e política do Ocidente, mas a esta discussão não se presta o presente trabalho.

1.2.2. EVOLUÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS

A Constituição de 1824 já trazia em seu bojo um título tratando acerca das garantias dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros, seguindo a tendência desencadeada pela declaração francesa, prevendo direitos e garantias individuais nos trinta e cinco incisos do seu artigo 179 como o principio da legalidade, da igualdade, inviolabilidade de domicílio, proibição da tortura etc.

A Carta Constitucional de 1891, a primeira constituição republicana, também declarava expressamente um rol de direitos humanos fundamentais, sob o título III, seção II, denominado “Declaração de Direitos”.

O artigo 72 do deste diploma constitucional, previa, além dos direitos e garantias que foram antes estabelecidos pela Constituição de 1824, o direito de reunião, a ampla defesa, o habeas corpus, o tribunal do júri etc. Assim como na anteriormente citada, nesta Constituição, a garantia aos direitos fundamentais se dava somente no plano formal, o texto constitucional listava os direitos, porém não demonstrava ou determinava quais seriam os meios para a sua efetivação.

A Constituição de 1934 reflete o período da segunda geração dos direitos fundamentais no Brasil. Pode-se destacar no rol de direitos fundamentais previsto no artigo 113 desta Constituição a previsão do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada, a assistência jurídica gratuita, o mandado de segurança e a ação popular.

Tão somente no caput deste artigo já é possível perceber a influência da geração dos direitos sociais, ao a letra da lei repetir o enunciado da Constituição de 1891, apenas acrescentando o direito à subsistência, e em termos materiais, avilta-se a proteção trazida para o trabalhador sob o fundamento de direitos humanos.

Na Carta Magna de 1937, apesar da conjuntura histórica não se mostrar favorável a um avanço no que diz respeito ao rol de direitos humanos constitucionalmente previstos, pode-se citar a proibição da existência de penas perpétuas, porém desaparecia neste mesmo momento a liberdade de imprensa e o direito à livre associação.

A Constituição de 1946 destacou-se por prever um amplo rol de direitos sociais relativos aos trabalhadores e empregados, além de dedicar uma proteção especial à família, à educação e à cultura. A de 1967 seguiu o movimento da segunda geração de efetivação dos direitos sociais, destacando-se a garantia da incolumidade física e moral dos detentos, e o sigilo das comunicações.

A Emenda Constitucional de 1969 adicionou ao patrimônio jurídico fundamental um seguro contra acidentes de trabalho mediante a contribuição da União, do empregador e do empregado, mas, ao mesmo tempo, ampliou consideravelmente a possibilidade de excepcionais restrições aos direitos e garantias individuais.

Aos cinco dias do mês de outubro do ano de 1988, foi promulgada a Constituição mais democrática que o país já possuiu, e esta foi a responsável pela grande ampliação ocorrida no rol dos direitos humanos fundamentais, trazendo-os, inclusive, antes de dispor sobre a organização do próprio Estado. Nesta Constituição além dos direitos e garantias individuais e sociais, incorpora-se a proteção aos direitos coletivos e difusos, identificados como a terceira geração dos direitos fundamentais.

1.3. A Categoria Dogmática dos Direitos Fundamentais

Para instruir e embasar as idéias que serão discutidas no capítulo derradeiro deste trabalho, será necessário discorrer, ainda que de forma sucinta, sobre os direitos fundamentais e o seu enquadramento no sistema jurídico-dogmático, para assim, à luz destes esclarecimentos, ser possível trazer à discussão as técnicas apresentadas e defendidas como sendo ideais para uma correta hermenêutica dos direitos fundamentais.

Como já exposto anteriormente, o conceito de direitos fundamentais não é pacífico na doutrina, seja ela pátria ou alienígena. Isto, consequentemente, reflete sobremaneira na questão do enquadramento dogmático, fato pelo qual, esta exposição não vislumbra determinar “o enquadramento correto”, antes porém, apenas apresentar as nuances possíveis para tal caracterização.

Primeiramente há de se afirmar que direito fundamental, norma de direito fundamental e dispositivo de direito fundamental não possuem em hipótese alguma o mesmo significado, mesmo estando quase que umbilicalmente ligadas umas as outras.

O direito fundamental em si é a idéia que norteia a proteção que irá ser conferida ao cidadão ou à sociedade. Este conceito encontra-se no plano das idéias e não representa algo que se possa diretamente aplicar ou fazer valer. Para que sejam consubstanciados e posteriormente concretizados, estes conceitos abstratos terão de se valer dos dispositivos de direito fundamental.

Dispositivo de direito fundamental, por seu turno, são os enunciados jurídicos. São as normas jurídico-positivas ou não, onde se pretende estabelecer a proteção a ser destinada ao conceito abstrato de direito fundamental que se referiu acima.

Podemos citar todos os incisos incluídos no artigo 5º da Constituição Federal como exemplos de dispositivos de direito fundamental. Naqueles textos, o legislador intentou positivar a proteção aos direitos fundamentais em sentido abstrato, fornecendo ao intérprete um substrato por sobre o qual ele irá efetivamente determinar a proteção àquela idéia fundamental.

A norma de direito fundamental, é uma especificação do conceito de norma em geral, que traz consigo dificuldades já bastante conhecidas. A norma é o resultado da interpretação e não o seu pressuposto, o seu início.

Neste sentido, a obtenção da norma é a razão de existir da hermenêutica jurídica, que irá fornecer ao intérprete os meios e procedimentos necessários para que este, frente a enunciados jurídicos, possa deles extrair a norma que ali jaz submersa ou subentendida.

Trazendo para o campo dos direitos fundamentais, a norma de direito fundamental seria o conteúdo concreto deste direito alcançado após a incursão do intérprete por sobre o dispositivo correspondente àquele direito, buscando a sua abrangência, alcance, limitação, para assim determinar concretamente o seu conteúdo, resultado da interpretação.

Aparentemente simples, este processo de obtenção da norma de direito fundamental a partir dos dispositivos é um procedimento deveras complexo, complexidade esta que move e motiva a realização deste trabalho.

1.3.1. NORMAS DE DIREITOS FUNDAMENTAIS: PRINCÍPIOS OU REGRAS?

Estabelecido que o objeto de estudo deste trabalho serão as normas jurídicas de direitos fundamentais, passa-se a uma discussão não menos complicada e polêmica: caracterizam-se as normas de direitos fundamentais como regras ou como princípios? Esta distinção será de singular importância para a correta construção de uma hermenêutica dos direitos fundamentais, influenciando nos métodos hermenêuticos aplicáveis, nas restrições possíveis etc.

1.3.1.1. Distinção entre princípios e regras

O sistema jurídico, principalmente aquele calcado no positivismo, não admitia a existência de outros enunciados jurídicos que não fossem as regras. As regras identificavam-se com os preceitos escritos, positivos, concretos, que possuíam um comando direto e claro, sem qualquer espaço para o intérprete manejar a sua aplicação ou interpretação.

Entretanto, a doutrina jurídica percebeu que o ordenamento não era somente composto por regras, e, além disto, que quando o intérprete era chamado a aplicar uma norma, ou mesmo quando o legislador criava uma regra, existiam influências outras que não as regras jurídicas pré-estabelecidas, existiam idéias de alcance mais geral e que não se encontravam positivadas como enunciados jurídicos.

Ronald Dworking, criticando o positivismo de Hart, buscou em precedentes dos tribunais norte americanos decisões em que os magistrados embasaram seus “decisums” não em regras jurídicas positivas, mas em idéias que se sobrepunham a estas regras.

Traz o exemplo sobre a possibilidade de um herdeiro nomeado no testamento do seu avô poder herdar o disposto naquele ato de última vontade mesmo tendo sido responsável pela morte do de cujus. O tribunal de Nova Iorque, neste caso, se valeu de uma máxima geral do direito de que ninguém pode lucrar com a sua própria fraude e adquirir bens em decorrência do seu crime, e com este argumento, impediu o homicida de receber a herança.

Este reconhecimento pelos juristas de que existiam orientações para além do comando legislativo e que, por muitas vezes poderia sobrepor-se a ele, demandava o reconhecimento de uma outra fonte normativa. O conceito de norma deixaria de ser considerado como um sinônimo de regra, abrangendo uma nova categoria, os princípios jurídicos.

Na busca pela diferenciação entre princípios e regras, vale citar as palavras de Dworkin :

A diferença entre princípios jurídicos e regras jurídicas é de natureza lógica. Os dois conjuntos de padrões apontam para decisões particulares acerca da obrigação jurídica em circunstâncias específicas, mas distinguem-se quanto à natureza da orientação que oferecem. As regras são aplicáveis à maneira do tudo-ou-nada. Dados os fatos que uma regra estipula, então ou a regra é válida, e neste caso a resposta que ela fornece deve ser aceita, ou não é válida, e neste caso em nada contribui para a decisão. (…)
Mas não é assim que funcionam os princípios apresentados como exemplos nas citações. Mesmo aqueles que mais se assemelham a regras não apresentam conseqüências jurídicas que se seguem automaticamente quando as condições são dadas. (…)
Essa primeira diferença entre regras e princípios traz consigo uma outra. Os princípios possuem uma dimensão que as regras não têm – a dimensão do peso ou importância. Quando os princípios se intercruzam (por exemplo, a política de proteção aos compradores de automóveis se opõe aos princípios de liberdade de contrato), aquele que vai resolver o conflito tem de levar em conta a força relativa de cada um. (…)
As regras não têm essa dimensão. Podemos dizer que as regras são funcionalmente importantes ou desimportantes (…)
Se duas regras entram em conflito, uma delas não pode ser válida. A decisão de saber qual delas é válida e qual deve ser abandonada ou reformulada, deve ser tomada recorrendose a considerações que estão além das próprias regras.

Dworkin traz principalmente a diferenciação das regras e dos princípios em relação às suas características formais e elementos da sua aplicação, porquanto, não adentra, neste ponto, às diferenças quanto ao conteúdo das situações normadas por cada uma das espécies em comento.

Com propriedade, Humberto Ávila, expôs sistematicamente a diferenciação entre regras e princípios . Este autor sistematiza a diferenciação sobre três prismas: o dever imediato e mediato; a justificação e a pretensão de decidibilidade, sobre os quais traremos breves considerações.

No que tange ao dever imediato, as regras são normas eminentemente descritivas da conduta a ser adotada enquanto estabelecem permissões, obrigações ou proibições. Os princípios, por seu turno, são normas finalísticas, eles estabelecem um ideal, um fim que deve ser buscado, e inclusive observado pelo legislador para criar as regras direcionadas a este fim estabelecido pelo princípio. Neste sentido podemos qualificar as regras como mediatamente finalísticas.

Quanto à justificação, Ávila, se dissocia do critério trazido por Dworking no que tange à aplicação das regras e princípios, baseado no tudo ou nada para as regras e na ponderação para os princípios. O autor procura analisar a diferença quanto à interpretação e aplicação destes institutos analisando a justificação necessária a aplicação de cada um deles.

Para as normas, mais justificada será a aplicação quanto maior for a correspondência entre os fatos concretos, a hipótese normativa e à finalidade que se lhe sobrepõe. Já para os princípios, devem ser avaliadas as conseqüências da conduta adotada para a consecução do ideal inserido nos princípios, ou seja, “uma avaliação de correlação entre os efeitos da conduta a ser adotada e a realização gradual do estado de coisas exigido”.

O critério da pretensão de decibilidade traz consigo as conseqüências da escolha do intérprete por uma regra ou por um princípio para a decisão jurídica a ser tomada. Os princípios são vistos como normas complementares e parciais, ou seja, não necessitam para ser aplicados de abrangerem todo o tema objeto da decisão, e a sua aplicação não demanda uma solução específica. O papel dos princípios é o dia contribuir para a tomada de decisão, e não a vincular a uma única possibilidade.

As regras, ao reverso, são consideradas normas decisivas e abarcantes, na medida em que para a sua aplicação exigem que seja regulada sob a sua égide toda a situação fática a ser decidida, e, terminam por demandar uma decisão específica diretamente decorrente da sua aplicação.

1.3.1.2. As normas de direito fundamental como modelo misto

A exposição das diferenças entre regras e princípios feita no item anterior poderia levar a uma segura definição sobre em qual das espécies dogmáticas dever-se-ia enquadrar as normas de direitos fundamental. Entretanto, ao enfrentar esta questão, a doutrina percebeu que não se poderia simplesmente estabelecer uma distinção estanque em face do caráter híbrido que as normas em análise possuem, e coube a Robert Alexy , trazer a idéia da dualidade das normas de direito fundamental. Seriam elas, em parte regras e em parte princípios.

Segundo esta linha de pensamento, os catálogos de direitos fundamentais previstos nas constituições veiculariam regras na medida em que orientam e emanam definições precisas e definitivas, porém afirma-se que atrás e ao lado destas regras existem princípios que lhe justificam e são positivados junto com as mesmas, gerando, a partir de um mesmo texto normativo, tanto uma regra como um princípio, que se correspondem e se completam na busca pelo “estado de coisas exigido”.

Esta concepção se coaduna perfeitamente com as disposições de direitos fundamentais trazidas pela Constituição de 1988 nos incisos de seu artigo 5º e demais disposições ao longo de todo texto constitucional.

Pode-se dar como exemplo de regra as disposições inscritas no inciso XXXIV , que trata do direito de petição e de certidões perante as repartições e órgãos públicos. Não há como se discutir o caráter descritivo destas normas, mas, mesmo assim, podem ser extraídos princípios destas disposições, como a liberdade de informação, a legalidade, e a ampla defesa.

Para a hipótese contrária, toma-se como paradigma o inciso XXIII que trata da função social da propriedade, e se forem levados em conta os critérios de distinção trazidos por Humberto Ávila, facilmente identificar-se-ia este dispositivo como sendo um princípio, ante a sua abstração e conteúdo finalístico.

Mesmo esta norma não pode ser somente considerada como um princípio. Não se pode negar a ela a força vinculativa que uma regra possui, e nem dela dissociar as regras que garantem a função social da propriedade em sim mesma. Seria possível, ainda assim, fazer uma correspondência entre a situação fática e a mencionada na norma, caracterizando uma regra.

De fundamental importância se mostra esta discussão para o desenrolar do presente trabalho, uma vez que, a hermenêutica das normas é deveras influenciada pelo fato de estar-se diante de regras ou princípios.

Nos dizeres de Jane Reis Gonçalves Pereira :

Há uma estreita conexão entre a adoção de um modelo de regras ou de princípios e a metodologia empregada para solucionar problemas de direitos fundamentais. (…) a idéia de aplicação gradual de normas jurídicas liga-se à admissibilidade de restrições aos direitos fundamentais e ao método ponderativo, enquanto o modelo de regras, por pressupor que a aplicação dos direitos envolve um raciocínio binário, entende estes como irrestringíveis e tem como metodologia básica o delineamento do âmbito de incidência das normas constitucionais.

É, portanto, partindo das premissas estabelecidas neste ponto acerca dos direitos fundamentais que se desenvolverá a análise da hermenêutica dos direitos fundamentais desenvolvida no próximo ponto.

2. A HERMENÊUTICA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Depois de traçar um breve apanhado acerca dos direitos fundamentais, está sedimentado o terreno para que se possa adentrar à discussão específica da hermenêutica dos direitos fundamentais em sentido próprio, à luz de tudo quanto foi exposto até aqui.

Para tratar da hermenêutica dos direitos fundamentais antes, porém, tem-se que tratar da hermenêutica constitucional, uma vez que, é neste diploma onde se consolidam tais direitos, e sua hermenêutica será específica ante ao seu caráter de carta política, podendo-se enquadrar a hermenêutica dos direitos fundamentais como uma subespécie da constitucional.

2.1. A Hermenêutica Constitucional

Nos primórdios da ciência hermenêutica não se tratava de qualquer especialização concernente a algum ramo do Direito. A ciência da interpretação foi construída por sobre o direito privado, mais especificamente por sobre o direito civil, e, tinha-se como verdade o fato de que tais orientações serviriam para toda e qualquer interpretação jurídica, independentemente do ramo do Direito em que se enquadrassem os dispositivos analisados.

Foi somente a partir do fim da Segunda Grande Guerra Mundial que o problema da interpretação jurídica ganhou complexidade e iniciou a busca por métodos específicos para normas que possuíssem características diferenciadas. Aos poucos a interpretação constitucional ganhou autonomia muito em função dos procedimentos de democratização política dos Estados e a criação dos Tribunais Constitucionais.

Mas porque dedicar à Constituição uma subespécie própria da ciência hermenêutica é uma questão que precisa ser aqui analisada e contribuirá por si mesma à elucidação de como estabelecer os critérios de interpretação adequados para uma correta e justa concretização constitucional.

2.1.1. ESPECIFICIDADES DA NORMA CONSTITUCIONAL

Para além dos métodos interpretativos comuns de conhecimento geral (literal, histórico, sistemático e teleológico), algumas características das normas constitucionais exigem uma sistematização própria de novos métodos, e finalidades na interpretação do diploma magno.

Primeiramente tem-se de destacar o caráter de norma fundadora do Estado. A constituição como norma mater do ordenamento jurídico do Estado de Direito é a fonte de justificação e derivação de todas as demais normas jurídicas admitidas como pertencentes ao ordenamento, e a sua interpretação irá influenciar, por via reflexa, a de todas as outras normas que lhe são submetidas.

Além disto, é na carta constitucional que está disciplinada a formação e o funcionamento do próprio Estado, os limites da sua atuação e as possibilidades do controle a ser exercido pela sociedade. Este caráter de norma institucionalizadora também confere à Constituição pormenores que não podem passar despercebidos do intérprete quando da análise do texto normativo.

Gerando maior impacto do que os anteriormente descritos, temos o caráter político da norma constitucional como elemento diferenciador das demais normas e, portanto, ensejador de uma análise diferenciada de acordo com os objetivos que almeja.

Como afirma J. J. Gomes Canotilho , a Constituição é “um estatuto jurídico do político”, destinando-se às questões dos limites e exercício do poder estatal, estruturando o próprio Estado e o Governo, além de consagrar valores de origem coletiva e transindividual.

Por conta deste caráter eminentemente político, a construção das normas constitucionais sofre demasiada influência das ideologias que dominam a sociedade em determinada época e local, refletidas na formação e atuação do poder constituinte. Como corolário desta influência, o intérprete deve sempre ter em mente os termos e alcance que esta logrou, para assim determinar a sua presença no conteúdo da norma e sua conformidade com as premissas atuais.

Feliz a lição de Celso Ribeiro Bastos e Carlos Ayres de Brito ao afirmar que:

É precisamente em função da permanência gravitacional de dados pré-jurídicos, nos contornos significantes da regra já positivada, que os constitucionalistas falam de sensibilidade metajurídica do intérprete. Sensibilidade que se volta para um trabalho de permanente conciliação entre a ideologia vigente, substante uma alma coletiva, e aquele que transparece na expressão lingüística produzida.

Deve-se, ao interpretar, não somente levar em conta aquilo que está exposto no dispositivo, mas sim ter em mente os valores políticos que levaram àquela normatização para da análise do texto à luz destes valores se possa chegar ao verdadeiro conteúdo da norma constitucional.

Uma outra conseqüência do caráter político do diploma constitucional emerge em relação à linguagem utilizada na formação de suas normas e o sentido que o intérprete deverá atribuir aos termos que foram utilizados na formação do teor literal da norma. Tem-se em razão disso a defesa do princípio da coloquialidade dos termos constitucionais.

A idéia da coloquialidade dos termos constitucionais foi primeiramente defendida por Celso Ribeiro Bastos e Carlos Ayres de Brito para quem, devido ao seu caráter de “cartilha de primeiras letras jurídicas”, a Constituição utilizava em seu texto as expressões em seu sentido comum, pois, esta será tão mais recepcionada quanto maior for a sua identidade com o domínio lingüístico de seus destinatários.

No mesmo sentido se posiciona Carlos Augusto Alcântara Machado , para quem, aludindo à idéia de Celso Bastos e Carlos Ayres Britto e o posicionamento de Geraldo Ataliba, a utilização de termos técnicos no texto constitucional é uma exceção, e, portanto, sempre que existir dúvida acerca do sentido a ser deferido a determinada palavra, o legislador deve utilizar o sentido comum, ordinário, principalmente em face do caráter de documento político que identifica uma Carta Constitucional.

Manoel Jorge e Silva Neto avança na defesa da coloquialidade dos termos constitucionais alçando-a ao grau de princípio. Para o autor, mas do que uma característica lingüística como defendiam os precursores da idéia, a coloquialidade é um verdadeiro princípio que deve nortear a atuação do intérprete, visto que, as expressões inseridas no texto constitucional por diversas vezes extrapolam o sentido técnico-jurídico que comumente lhes é atribuído.

Diante de tantas especificidades que emanam das normas constitucionais e a conseqüência da inaplicabilidade direta dos métodos hermenêuticos comuns à interpretação constitucional, a doutrina terminou por estabelecer princípios específicos para esta interpretação.

2.1.2. OS PRINCÍPIOS DA INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL

J. J. Gomes Canotilho traz em seu livro um catálogo dos princípios da interpretação constitucional, como resultado de uma necessidade da doutrina e da práxis jurídicas em encontrar tópicos que auxiliassem na tarefa de interpretar a Constituição.

Antes de passar à análise de cada um destes princípios em espécie cabe ressaltar que eles não tem caráter normativo, e sim tópico, servem como um guia para que o intérprete possa buscar aquela interpretação que melhor se adéqüe à realidade e à justiça levando em conta a constituição como um todo.

Gilmar Mendes, Inocêncio Coelho e Paulo Gustavo Branco , chamam atenção para este aspecto quando afirmam que:

Deve-se esclarecer, desde logo, que esses princípios não têm caráter normativo, o que significa dizer que eles não encerram interpretações de antemão obrigatórias, valendo apenas como simples tópicos ou pontos de vista interpretativos, que se manejam como argumentos – sem gradação, nem limite – para a solução dos problemas de interpretação, mas que não nos habilitam, enquanto tais, nem a valorar nem a eleger os que devam ser utilizados em dada situação hermenêutica.

Estabelecida esta premissa, passa-se aos princípios.

2.1.2.1. A unidade da Constituição

De acordo com o princípio da unidade da Constituição o intérprete deve sempre considerar as normas constitucionais não isoladamente, mas como parte integrante de um sistema unitário composto de normas e princípios, para que, deste modo, evite contradições entre suas normas.

O dever do intérprete neste caso, é, nas palavras de Canotilho , “considerar a constituição na sua globalidade e procurar harmonizar os espaços de tensão”. Este princípio dará suporte a praticamente todos os métodos hermenêuticos e através dele se poderá afastar os conflitos aparentes entre os dispositivos constitucionais.

2.1.2.2. A eficácia integradora

Este princípio determina que o legislador, ao buscar a interpretação correta para o dispositivo constitucional, deve dar preferência às interpretações que favoreçam a integração social e a unidade política da constituição. Não se parte de uma concepção de integração entre Estado e sociedade, antes, se utiliza dos conflitos para buscar soluções integralizadoras.

A necessidade deste princípio assenta no fato de que toda Constituição precisa controlar as implosões sociais para manter a ordem e fazer subsistir uma coesão sociopolítica, a fim de que, se viabilize a existência efetiva de um ordenamento jurídico.

2.1.2.3. A máxima efetividade

O princípio da máxima efetividade orienta o jurista a interpretar o texto constitucional sempre em busca do sentido que lhe garanta a maior efetividade possível, sem contanto, modificar o conteúdo da norma. Nomeia-se este princípio também de interpretação efetiva.

De grande aplicação principalmente no que tange às normas de direitos fundamentais, deve-se ter bastante cuidado ao lançar mão deste princípio, uma vez que, à efetividade do direito de um corresponde ao declínio do direito alheio, impondo ao jurista que concilie a aplicação deste princípio com os demais princípios e normas, protegendo, até mesmo, a própria unidade da Constituição.

2.1.2.4. A conformidade funcional

Também chamado de princípio da justeza ou correção funcional, este tópico traz a idéia da proteção à organização funcional estabelecida pela própria Carta Magna. Não deve o intérprete, por exemplo, promover qualquer interpretação que venha a contrariar a repartição de competências constitucionalmente estabelecidas, ou mesmo da separação de poderes.

Usualmente é aplicado no âmbito dos Tribunais Superiores, nomeadamente quando do controle de constitucionalidade de normas, onde se encontrarão frente a frente interpretações divergentes oriundas do Poder Legislativo e do Poder Judiciário, servindo este princípio para evitar interpretações que desregulem o equilíbrio instituído entre os poderes.

2.1.2.5. A concordância prática

Este princípio, conhecido por harmonização, está diretamente ligado ao conceito de que não existe hierarquia entre os bens constitucionalmente protegidos, não podendo, assim, uns se sobreporem ao outros sem que esteja comprometida esta isonomia constitucional.

Diante deste quadro de não hierarquização, deve o intérprete buscar uma harmonização entre estes bens jurídicos de modo que a proteção de um não resulte da extinção do outro. Esta atuação somente pode ocorrer quando da análise do caso concreto, daí a nominação como concordância prática.

O correto uso deste princípio conduz à ponderação entre as forças constitucionais que influenciam na decisão do jurista, porém, isto não significa que na decisão em concreto deverão prevalecer ambos os interesses, pois, como alega Inocêncio Mártires Coelho , à luz do caso prático, uma parte será vencedora em tudo e a outra perdedora em tudo. Entretanto isto não invalida o princípio, visto que, aquele bem ora preterido continuará a vigorar na Constituição e poderá ser aplicado em outros casos, sendo este o sentido da concordância prática.

2.1.2.6. A interpretação conforme a Constituição

Alguns autores ainda falam no princípio da força normativa da Constituição mas não se entende aqui que este mereça uma menção individualizada, uma vez que busca sempre garantir efetividade às normas constitucionais, conceito já protegido pelo princípio da máxima efetividade tratado supra

O princípio da interpretação conforme a Constituição não simplesmente um tópico hermenêutico, mas sim parte integrante de todo um sistema de controle das normas constitucionais, trabalhando em conjunto com o princípio da unidade e da conformidade funcional.

Para o intérprete este tópico traz a obrigação de conciliar toda e qualquer interpretação com os preceitos estabelecidos na Constituição, calcando-se sempre na prevalência da Constituição, excluindo-se interpretações que contrariem a norma maior e na possibilidade de uma interpretação conforma para evitar a declaração de inconstitucionalidade de uma norma.

Canotilho chama atenção para o cuidado que se deve ter com a aplicação deste princípio no que tange a evitar a declaração de inconstitucionalidade de uma norma através de uma interpretação conforme. O autor português lembra que a existência deste princípio não traz consigo uma autorização para que se proceda a uma interpretação contra legem.

Por conta disto, somente seria possível tal interpretação conforme quando existisse no dispositivo aquilo que o autor denominou “espaço de decisão”. Onde diante de várias possibilidades interpretativas, uma seria conforme a Constituição e deveria prevalecer, preterindo-se as demais. Caso não se pudesse encaixar a interpretação conforme dentro deste “espaço de decisão” não restaria ao jurista outra saída a não ser a declaração de inconstitucionalidade da norma.

2.1.3. A INTERPRETAÇÃO PLURALISTA DE PETER HÄBERLE

Expostos os princípios atinentes à interpretação constitucional, é necessário neste momento expor sobre uma teoria que logrou alçar um grau de importância considerável na seara da hermenêutica constitucional, principalmente quanto a interpretação dos direitos fundamentais.

Peter Häberle brinda a doutrina jurídica com a sua sociedade aberta dos intérpretes da Constituição: contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da Constituição, questionando todo o modo sobre o qual se realiza a interpretação constitucional moderna e propondo uma abertura do sistema de tal modo que pulverizar o rol dos intérpretes.

Inconformado com a forma sob a qual se desenvolve a hermenêutica constitucional, Häberle faz uma análise sobre os participantes do processo de interpretação constitucional constatando que, em regra, estes se limitam ao rol designado ou legitimado pelo sistema jurídico positivo, constituindo aquilo que ele denominou de intérpretes oficiais da constituição.

Para o autor alemão, uma democracia constitucionalista calcada efetivamente na participação popular não pode ser coerente nem compatível com um sistema fechado de intérpretes constitucionais, devendo-se ampliar este rol de intérpretes assim como dos participantes no processo interpretativo como um todo, refletindo em toda interpretação constitucional e até mesmo na própria teoria constitucional pós-moderna.

Nas palavras de Häberle :

A investigação sobre os que participam do processo de interpretação é, de uma perspectiva sócio-constitucional, conseqüência do conceito republicano de interpretação aberta que há de ser considerada como objetivo da interpretação constitucional (…) Uma teoria constitucional que se concebe como ciência da experiência deve estar em condições de, decisivamente, explicitar os grupos concretos de pessoas e os fatores que formam o espaço público, o tipo de realidade de que se cuida, a forma como ela atua no tempo, as possibilidades e necessidades existentes.

Neste diapasão segue o autor defendendo que a interpretação constitucional não pode ser considerada apenas como um evento exclusivamente estatal na medida em que todas as forças da comunidade política tem acesso e influenciam o procedimento, tanto teórico como na práxis.

A essas forças da comunidade política Häberle denomina espaço público, onde estariam representadas as forças produtivas da interpretação, como os cidadãos, grupos organizados, além dos órgãos estatais formalmente legitimados para realizar a interpretação. Este seria o sentido lato do termo intérpretes constitucionais.

O reconhecimento de uma interpretação aberta traz para a hermenêutica dos direitos fundamentais conseqüências de grande importância. O próprio Häberle trata do tema ao afirmar que não existe intérprete melhor para a norma de direito fundamental do que o seu destinatário, aquele que vivencia a norma no dia a dia, que a consolida a cada momento e neste consolidar ao mesmo tempo a intérprete continuamente.

Seriam estes sujeitos ao menos pré-intérpretes das normas constitucionais, mais especificamente daquelas que versam sobre direitos fundamentais, e não se poderia desconsiderar a contribuição destes para a interpretação oficial.

Partindo do anteparo legal da Constituição Alemã, o autor propõe a ampliação dos mecanismos de participação popular, em sentido lato, na interpretação constitucional institucionalizada, reconhecendo-se outras formas de influência além daquelas já consagradas como as manifestações dos partidos políticos, plebiscitos, etc.

Para a realidade nacional a situação encontra-se ainda mais fechada no que tange ao rol dos intérpretes. É diminuta a participação popular na interpretação das normas constitucionais, e mesmo quando esta ocorre, não a podemos considerar como um reflexo dos anseios da sociedade como um todo. Não se caracteriza a participação do espaço público de Häberle no âmbito do sistema constitucional brasileiro.

Não se pode negar a relevância desta tese para uma real efetividade dos direitos fundamentais, a partir do momento em que ela chama ao processo interpretativo aquele que são os destinatários das normas, e que, consequentemente, anseiam pela sua aplicação e efetividade.

A contribuição que estes intérpretes extra-oficiais podem dar para o desenvolvimento da interpretação constitucional é inestimável, e Häberle, ao propor tal sistemática, faz recordar o fato de que o Direito existe para assegurar a realização dos direitos dos seus destinatários, e não por si próprio, motivo pelo qual, não se pode perder de vista nunca que o objetivo maior da interpretação das normas de direito fundamental é a sua efetividade.

2.2. A Concretização como Método Hermenêutico das Normas de Direito Fundamental

A evolução constitucional modificou o cerne da hermenêutica aplicada a este ramo do Direito. Onde anteriormente buscava-se o sentido da separação de poderes do Estado, da sua constituição e regulação, e da divisão de competências, com o Estado Social, transmuda-se este foco para os direitos e garantias fundamentais, visando uma parte mais substantiva da Constituição.

Esta mudança fez com que os métodos hermenêuticos apresentados no primeiro capítulo deixassem de ser suficientes para uma correta interpretação das normas constitucionais e especialmente para as normas de direitos fundamentais, exigindo-se uma reformulação dos métodos para que seja possível adequar a interpretação à nova realidade.

Diante deste quadro e tendo em vista as especificidades das normas de direitos fundamentais, chegou-se à máxima: “os direitos fundamentais, em rigor, não se interpretam; concretizam-se”.

O método concretizador foi trazido à doutrina jurídica por Konrad Hesse, para quem, interpretar as normas de direitos fundamentais significa concretizá-los, fazer com que sua aplicação ao caso concreto seja feita de maneira a efetivar aquilo que está posto, desprezando os métodos clássicos em razão de que aqueles foram criados para a interpretação das normas privadas e não serviam para as normas de direitos fundamentais ante o seu caráter complexo e o seu alcance normativo pluridimensional.

Apresentava-se, então, a hermenêutica concretizadora como uma alternativa aos métodos clássicos.

Não se pode negar a influência da Tópica de Vieweg na teoria de Hesse, uma vez que, no método da concretização também se concentra o trabalho do intérprete no problema, ela somente é possível em face de um problema concreto, pois, só existe espaço para interpretação onde existe dúvida, e somente existe dúvida se houver um problema.

Esta teoria une o momento da determinação do sentido da norma e da sua aplicação em um só desígnio. O teor da norma só é obtido a partir do ato aplicador-interpretativo.

Para Hesse, são três os elementos principais da interpretação concretizadora: a norma que se deseja concretizar, o problema concreto a resolver e a compreensão prévia do intérprete. Apesar de reconhecer a interferência pessoal do intérprete no processo interpretativo, Hesse não lhe atribui importância tamanha a ponto de reconhecer-lhe um poder criador. Para o autor, por exemplo, não é o jurista responsável por determinar qual a dúvida a ser resolvida, é, antes, o problema que traz consigo a própria dúvida. O intérprete influencia no resultado da concretização, mas não o direciona.

Além da influência do próprio intérprete, para que se tenha uma efetiva concretização é preciso levar em conta também o resultado das forças sociais que atuam por sobre o problema a ser elucidado. Neste sentido, singulares as palavras de Sidney Guerra e Lílian Márcia Balmant Emerique :

Assim, a concretização do conteúdo de uma norma constitucional, bem como sua realização, só é possível incorporando as circunstâncias da realidade que essa norma procura regular. As singularidades destas circunstâncias compõem o âmbito normativo, o qual, a partir do conjunto dos dados sociais afetados por um preceito, e através do comando contido sobre todo o texto da norma, o programa normativo é elevado à condição de parte integrante do conteúdo normativo.

O maior mérito de Hesse ao elaborar a teoria do método hermenêutico-concretizador foi fazer uma releitura da tópica de Vieweg procurando soluções para a falta de normatividade inerente a esta tese, e para o seu caráter de acessório e não de método interpretativo autônomo.

A busca destas soluções quedou por determinar dois pontos de apoio indispensáveis à teoria de Hesse: a função orientadora dos princípios da interpretação constitucional e o estabelecimento do texto da norma constitucional como limite à interpretação concretizadora.

A importância dos princípios da interpretação constitucional, já expostos no início do presente capítulo, reside na manutenção da ordem constitucional e principalmente na prevenção à existência de contradições entre as normas constitucionais e entre estas e os fundamentos da Constituição. A existência destes princípios parte do pressuposto de que a própria Constituição traz elementos orientadores da sua interpretação, e Hesse reafirma a força destes elementos dos quais não poderá o intérprete se dissociar quando da concretização da norma.

O reconhecimento da limitação do intérprete ao texto da norma é também de suma importância, pois vincula a interpretação a algo pré-estabelecido de forma vinculante pela Constituição, onde se encerram as possibilidades de compreensão lógica do texto da norma, trazendo para o interior desta doutrina uma função racionalizadora, limitadora e estabilizadora do poder conferido ao jurista.

Mais uma vez, esclarecedoras são as palavras de Sidney Guerra e Lílian Márcia Balmant Emerique , ao tratar da limitação do intérprete às possibilidades conferidas pelo texto da norma:

Nas situações onde o intérprete se impõe a Constituição deixa de interpretá-la para mudá-la ou quebrantá-la. Quaisquer das condutas lhe estão vedadas pelo direito vigente. Inclusive quando o problema não pode resolver-se adequadamente por meio da concretização, o juiz, que se encontra submetido à Constituição, não pode eleger livremente os topois. Para uma interpretação constitucional que parte da primazia do texto este constitui o limite de sua atuação.

O avanço do intérprete para além do texto da norma consistiria em verdade numa violação à Constituição, jamais uma concretização das suas normas, revelando a principal diferença entre a tópica proposta por Hesse daquela doutrinada por Vieweg, conferindo ao método da concretização uma utilidade prática maior, permitindo-lhe ser considerado como um método hermenêutico autônomo.

É com base nestes ensinamentos que se deve proceder à interpretação das normas de direitos fundamentais, buscando não somente aferir o sentido do texto normativo, mas antes aperfeiçoá-lo em busca de uma maior efetividade à luz do problema concreto posto ao intérprete.

Deve-se ter em mente todos os influxos das forças sociais incidentes sobre o intérprete e também a sua própria compreensão, evitando, desta forma um afastamento da realidade prática, o que, inviabilizaria a busca pela efetividade máxima das normas de direitos fundamentais.

Mas não se deve considerar a teoria de Hesse isoladamente. Para uma interpretação ainda mais efetiva, ou seja, concretizadora. Deve-se trazer para este método hermenêutico as idéias de Peter Häberle acerca da sociedade aberta dos intérpretes constitucionais, buscando a participação dos destinatários das normas de direitos fundamentais na concretização do conteúdo dos dispositivos normativos correspondentes, visto que, são este que vivenciam e sofrem as conseqüências de sua aplicação pelo poder judiciário, e, portanto, tem melhores condições de determinar o quanto necessário para alcançar a efetividade dos preceitos consubstanciados em tais normas.

CONCLUSÃO

1. Os direitos fundamentais possuem como origem o princípio da dignidade da pessoa humana e podem ser definidos como um conjunto de faculdades e instituições que, em cada momento histórico, concretizam as exigências da dignidade, da liberdade e da igualdade humanas, devendo, estas, encontrarem-se positivadas pelos ordenamentos jurídicos.

2. Pode-se falar em três gerações de direitos fundamentais, os direitos e garantias individuais, os direitos sociais e os direitos coletivos e difusos, ressaltando o caráter não estanque destas gerações que em verdade se complementam.

3. O direito fundamental em si é a idéia que norteia a proteção que irá ser conferida ao cidadão ou à sociedade. Dispositivo de direito fundamental, por seu turno, são os enunciados jurídicos. A norma é o resultado da interpretação dos dispositivos.

4. Ante a distinção feita pela doutrina entre regras e princípios, verificou-se que as normas de direitos fundamentais não se compatibilizavam totalmente com nenhuma das categorias, terminando Alexy por propor uma dualidade destas normas, seriam em parte regra e em parte princípio.

5. A interpretação constitucional ganhou autonomia muito em função dos procedimentos de democratização política dos Estados e a criação dos Tribunais Constitucionais.

6. Diante de tantas especificidades que emanam das normas constitucionais e a conseqüência da inaplicabilidade direta dos métodos hermenêuticos comuns à interpretação constitucional, a doutrina terminou por estabelecer princípios específicos para esta interpretação.

7. Os princípios da interpretação constitucional não tem caráter normativo, e sim tópico, servem como um guia para que o intérprete possa buscar aquela interpretação que melhor se adéqüe à realidade e à justiça levando em conta a constituição como um todo. São eles: a unidade da Constituição; A eficácia integradora; A máxima efetividade; A conformidade funcional; A concordância prática; A interpretação conforme a Constituição.

8. Häberle faz uma análise sobre os participantes do processo de interpretação constitucional constatando que, em regra, estes se limitam ao rol designado ou legitimado pelo sistema jurídico positivo, devendo-se ampliar este rol de intérpretes assim como dos participantes no processo interpretativo como um todo, refletindo em toda interpretação constitucional e até mesmo na própria teoria constitucional pós-moderna.

9. Os direitos fundamentais, em rigor, não se interpretam; concretizam-se

10. Deve-se proceder à interpretação das normas de direitos fundamentais, buscando não somente aferir o sentido do texto normativo, mas antes aperfeiçoá-lo em busca de uma maior efetividade à luz do problema concreto posto ao intérprete.

11. É necessário, para uma correta interpretação das normas de direitos fundamentais, conciliar o método concretizador de Hesse com as idéias de Peter Häberle sobre a participação dos destinatários na interpretação constitucional.

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